sábado, 8 de dezembro de 2007

O HOMEM E A MULHER

Viagem longa de ônibus, um homem e uma mulher, por coincidência , sentaram lado a lado. Roçavam seus joelhos em silêncio.
Na verdade, o joelho dele se inclinava ao dela que permanecia estático. Depois de um tempo, foi o cutuvelo dele que encostava na parte delgada da cintura dela . A cintura não era cúmplice dessa história, nem tampouco resistente ao movimento de um cutuvelo em forma de pincelada.
Tempo passa, o ombro dele enverga ao dela se abaixando para ficar na mesma altura. Sabia o homem, que ombros juntos se tocando são quase rostos se beijando.
Ele aprendera na escola que o movimento dos dedos era o que diferenciava o ser humano dos animais. O comando dos dedos é de total controle do seu dono. Portanto, para eximir a dúvida que pairava sobre as intenções da mulher, entrelaçou seus dedos no dedinho dela, como se ali, houvesse finalmente um recado dado, ou até mesmo um bilhete escrito.
O dedinho dela se mantinha impávido, como quem fora envolvido e está se acalentando ou um dedo em que a sensibilidade, a vida teria levado.
Descendo do ônibus, ele a foi levando enganchada em seus braços. Ela não abria a boca. Chegaram no apartamento dele. Havia cheiro de coisas estragadas, discos jogados pela sala, um gosto de ressaca impregnado nas paredes. O homem tirou a roupa dele e tirou também a dela. Deitou-a no sofá jogando as tralhas no chão. Ali eles fuderam. No máximo ela fazia “hum” gemendo sem emoção.
Ele perguntou se podia batê-la , a mulher não respondia, e o olhava num misto de decência e cansaço. Levada desde o começo, até no sexo, vontade e desejo não lhes pareciam importantes.
Ele gozou em sua barriga e caiu ao lado no chão.
Dormiram. Quando a mulher acordou, saiu de fininho, o suficiente para acordá-lo. Deixou um bilhete: não quero mais.
Pela janela do seu apartamento, o homem ainda a viu pedindo “fogo” ao jornaleiro, para logo em seguida cair no sumidouro da multidão. Fechou a cortina, certo de que intimidade é algo que se faz a distância.

Um comentário:

romulo de almeida portella disse...

a delicadeza da descrição do contato no ônibus só é superada pela discreta, e genial, conclusão...