“Para ser coveiro tem que ser bom de buraco”. Essa era frase que Seu Luís, 30 anos de cova , se apresentava. Arranjou trabalho no cemitério por necessidade. Ali, foi seu primeiro e último ofício.
O começo não foi as mil maravilhas . Envergonhado, dizia que trabalhava na floricultura da frente. Depois acostumou e abria o jogo para quem perguntasse. Não tinha muito orgulho, mas, ufa, já podia falar o que fazia.
O tempo também ajudou acostumar a não se preocupar com morto. No início, tinha receio do defunto se mexer. Depois, foi esclarecido pela gerência que sua função era abrir e fechar cova. E só. Qualquer problema com o morto é problema do próprio...Bem, era problema da família ou do IML.
Religioso na juventude,o tempo foi passando e aquele fervor, desaparecendo. Separar o que é carne, matéria bruta do seu trabalho, do que é espírito, que ele nunca via, era muita criatividade do bicho homem.
Seu Luís foi ficando velho. Precisaria de muitas vidas para pagar sua cova. Tinha um lema para descansar em paz :”Cova é uma ova.” Além da falta de grana, não era de misturar vida pessoal com profissional. Deixava isso para os políticos.
Em uma quarta-feira não foi ao cemitério. Havia morrido. Mesmo assim seus amigos de labuta o esperavam. Agora como cliente. Mas foi cumprir seu lema. Cremado. Suas cinzas foram jogadas no buraquinho que fez no fundo de casa.
segunda-feira, 14 de abril de 2008
Assinar:
Postar comentários (Atom)
2 comentários:
Adorei teu texto!!! De uma simplicidade, mas de uma densidade que deixou minha alma arrepiada, parabéns.
Como o seu Luís estava certo!!!!a vida é desse jeito mesmo...vale o presente.
Postar um comentário