segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

COMPROMISSO

Alcançar o centro. Atingir o êxtase. Cartada final. Superar a respiração trôpega. Transfigurar em si mesmo. Ser mais do que se é. Furar o alvo. Fundir a essência da alma na matéria do corpo. Impregnar no ato mais banal a dimensão sublime da existência. Não faltar comigo.

terça-feira, 11 de novembro de 2008

CACHORRO VELHO NINGUÉM QUER

Um cachorro velho. Doente. Triste. De uma vida saudável, cheia de aventura, carinho dos humanos, ficou velho, decrépito, apodrecido, sem força nem vontade de agradar ou ser agradado. Irremediavelmente Velho. Tempo da destemperança. Velhice é foda. Dente podre, difícil de roer o osso. Latido sem vibração, pele seca.
Largado, moribundo, atrapalha o ar de quem respira, suja a roupa de quem o suporta. Hesita em aceitar o estado da natureza ou entra pelo caminho vil da felicidade gasta. Um lagarto que passa é motivo de emoção. Mata o bicho, come a carne. E o resto? Dormir, ouvir o silêncio da madrugada e saber mais e mais que é solitário. Mais um velho cachorro solitário que ninguém quer.

sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Barulho Esmaecido

Numa manhã gelada, era abrir a porta, e a neve já formava uma camada espessa despejando melancolia, desobrigando a infeliz tristeza de entrar. Havia uma loura olhando pela janela as imagens do jornal arremessado a pouco pelo entregador. Dores e cicatrizes fincavam o pé em diversos pontos da casa. Eu sei como tudo aquilo era possível. Não seriam velhas palavras para descrever o novo. Um silêncio rescendia tinta fresca, e as conversas mudaram a direção e tornavam-se circulares. Chamas incensadas pelo destino de ontem foram apagadas e nasciam outras, destinadas a queimar papel branco, limpo, e de melhor valia. Produto dos momentos que se sucedem, a teconologia ganhou status de desimportância. Reconheciam nela as frustrações de que fora seu despropósito. A cama embalava a todos como se cada passarinho pousasse para oferecer uma visita. A luta entre o bem e o mal não cessaria jamais, é que agora qual fosse o resultado, não seria o lamento que burlaria as regras para vencer novamente. O ouvido foi se aprimorando. Logo, logo , todos ouviriam músicas e só músicas, rocks entremeados por choros, chorinhos e chorões. Não competiam mais a eles explicar nem ao menos serem explicados. É que a razão com todos os seus postulados perdeu a chave de casa e ninguém era doido em avisá-la que estava em cima do armário. Do lado esquerdo de quem não tá nem aí para o que não seja simples amor.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

SUJEIRA

Ele conheceu ela grávida. Longe dela, não sabia se escrevia ou batia punheta. Exercícios impossíveis de uma vez só. Trepavam com volúpia. Jatos de mijo jorravam no rosto. Tinha o prazer de receber aquele líquido quase transparente de cheiro forte. Do mais, era engolir o que podia de porra branca. Gosto gostoso de homem. Com a aquela barriga branca, ela mal cabia no box. Todo o esforço era a garantia de sentir aquele perigoso pau arremessado por seus cabelos, bocas e queixos. Se queixava somente quando ele esquecia de mijar no cu dela. Molhava-se toda. Existia tanto, a ponto de ser um nada junto dele. Só tinham paz alguns minutos após o sexo. Logo, estavam atordoados pelo sentimento de serem moídos e se destruírem mais uma vez. Conhecereram uma outra mulher. Tímida, gostaram de Samanta. Muda, se masturbava como louca vendo o tarado casal. O bebê naquela barriga não recebia máculas. O feto só conhecia aquele tipo de amor. Chegava perto daquele homem e o membro dele ricocheteava, rijo. Assim como a humanidade acredita na lua e nas estrelas eles gozavam do que era sujo. Eram seus brancos mais alvos. A filha tocava piano e o pau dele subia com a música. Aquelas notas eram o "enfant terrible" alcançados em família. Mais sexo, mais gozo.Os outros eram relevantes. Se não traziam para o sexo, mortificavam. Chutavam cabeças daqueles que atrapalhassem qualquer manifestação de tesão. Sem dó nenhuma. Inclusive vó, tia e o cachorro. Os dois, chafurdando em porra, buceta, cu, pau, familia, comida, sujeira. Em nome da devassidão.

domingo, 7 de setembro de 2008

UFA

Inderteminação, planejar o ocaso, retardar o passo, acelerar para não ser engolido, correr, subir a montanha sem saber o porquê, acreditar no falso testamento, escrever. Vertigem. Um dia após o outro, alcançar o máximo...sensações, nada além de sensações. Sonhar, situar-se, dar forma e dimensão ao que faz ou ao que nunca se irá fazer. Inserir na teia. Respirar.Desobrigar-se de algumas vidas...pausa..levemente sorrir.

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

TORTURA CHINESA

10 aninhos. Papai, Mamãe e o cinegrafista. Olho nele filhinha! Vem andando, sorrindo, mão na cintura. Dá uma reboladinha, filhinha. Não, não é hora de sentir nada. Vai agora, sente, sinta! Não, não pense. Mexe o cabelo e vem. Repare sempre, atenção ao que fica belo em você. BELO, entendeu? O que é de bom gosto, gostado. Filhinha, um dia você entenderá o que estou dizendo. Você ainda tem um gosto a ser apurado. Você combina estranho. Mamãe só quer seu bem. Não duvide do nosso amor. Requintes são requintes, e só o tempo para lhe mostrar. Você não precisa sofrer para aprender, né? Estilo, filha, estilo, sem estilo você não é nada. Filhos dão um trabalho...

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

FLÁVIO

Flávio tinha máu hálito. O que no começo era piadinha de família, virou crônico na adolescência. O ar que emanava da boca de Flávio era horrível. Horrível ainda mais para ele que não se desvencilhava daquele mau cheiro que lhe rondava.
Esperançoso, Flávio fez as tentativas tradicionais: pastas de dentes especiais, listerines, escovação turca, halls , fortes bebidas alcoólicas pela manhã que de nada adiantaram. A fedentina se instalara nas profundezas do seu ser e a ciência não havia criado nada que fosse suficente para eliminá-lo.
Por uma grande tristeza, Flávio foi abatido. Perdeu a fé divina. Se Deus existisse, não seria capaz daquela maldade com ele.
Quando estava conversando com amigos, não havia alma generosa que conseguisse permancer ali , ainda que por um pequeno instante. Era sempre convidado para uma maldita "balinha". Recebido o convite, a ficha caía e o nível da tristeza subia. Ultrapassada a vergonha, Flávio foi a um psicanalista. Monólogo vai, monólogo vem, Dr. Xavier interrompe Flávio e solta a grande sacada:
- Você terá que conviver com isto. É o que você tem de diferente. Alie-se ao inimigo.
Olha que as palavras do Dr. fizeram bem a Flávio. O odor não desapareceu, mas a consciência tranquilizou. Relaxado, acabou conhecendo uma mulher interessante. Sabrina não se incomodava com o hálito de Flávio. Também era portadora do mesmo mal.
Flávio ficou feliz , mas ressabiado com o Dr. Xavica. No fundo, o que queremos é alguém parecido conosco. Nem que seja, no nosso pior.

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Coisas que eu Odeio (homenagem ao Fernando e ao Conrado que me conhecem)

Não levem a mal. São coisas que eu odeio mas acabo convivendo. Tem outro jeito?



Quando o público ou algum jornalista pergunta ao artista: Como é o seu processo criativo?
Não se ligou que o "como" não pertence ao cara. Isso é prá crítico responder e não pro artista.
Ah! bem, eu acordo cedo, beijo meu cachorro, tomo café bem quente e vem uns insightss. Porra!!!



Loura gringa no Brasil de sorriso colgate com aquele deslumbramento anglo-saxão:
- This is pretty, pretty, beatifull!! argh!!



Lugar em que os garçons usam touca na cabeça. Qual é a parada? Animalzinho domesticado do dono!!



Gordas branquinhas leitoras assíduas de Código Da Vinci ou Harry Porter.



Pessoas que falam alto ao celular. Pior, que falam "meu querido"!



Aquela que chega com fotos. E como uma nazistinha, joga aquele troço no teu colo e diz como numa sessão de tortura: Essas são as fotos do casamento meu com o Marcos!!



Pessoas que te vêem sem estar sorrindo (sic) e falam: Você está com algum problema? Você está triste? Vai se fuder ô bichinho animado!!



Pessoas que ouvem sua história e logo te cortam para contar uma dela com muito mais emoção pré-fabricada.
Não avisaram a ela que não é competição de quem é mais babaca..



Você vai numa livraria ou sebo comprar um livro e o atendente na maior cara de pau responde:
Esse livro nós vendemos ontem.

Você sempre vendem um dia antes o livro que eu quero. É comigo o problema?



Caixas de som toda fudida no centro com musiquinhas irritantes: Jurandir, vereador para melhorar nosso rio...


Mostras que repetem ad infinituum bossa-nova e Machado de Assis ( típico do Rio).

Deixa os caras descansarem em paz! Já ultrapassou o insuportável esses revivals.



Pessoas que tudo justificam com a maldita resposta: Ah, eu tenho que pagar minhas contas!
Porque você fuma maconha? Fumo, mais pago minhas contas..Ah, porquê você dá a bunda? Ah, porque tenho que pagar minhas contas. Porque você tá nesse emprego de merda que voce sabe que tem corrupção? Ah, Porque tenho que pagar minhas contas..



Você entra no ônibus e o cara puxa assunto de igreja.

Porra ,curte o teu Deus que eu curto o meu ( aliás, já faz tempo que eu não acredito mais nele!!)



Cara que chega em porta de cinema ,teatro ( típico em são paulo) e diz: Gosta de poesia?Gosto, só dos bons ...



Hippie que interrompe tua cerveja e diz: Quer ver meu trabalho?É umas sementes com dente de tubarão.. Cara , eu acho isso nojento...



Pentelhos estudantes que entram no ônibus de mochila nas costas. Não percebe que ocupam todo o espaço, ou a mamãe não ensinou a eles a lição de que não são os donos do mundo!!



O cara que tá fora do seu estado e força o sotaque natural para marcar diferença. (típico de gaúcho). Pior ainda aquele que, pelo contrário, tenta imitar o sotaque local.



Mulheres com tatuagem delicada e não decodificável no pulso. Você pergunta e ela responde. Ah! é cu em persa!Porra que merda!



Abuso da palavra nutre. O shampoo nutre, o creme nutre , o cereal nutre, a bunda da ta mãe nutre.



Homem de boina. Capítulo a parte. Ficam uma hora ano espelho para pôr aquela porra quente cuidadosamente na porra da cabeça. Lembrando Che ou intelectais frances. Dizem que o Che perdeu a boina na batalha de Miraflores. Pior ainda são os de sapatos coloridos.



Pessoas que tudo colocam em qualquer caso, uma gravidade, um peso: Você não sabe o que aconteceu?
Sei, tua mãe deu a bunda pro teu pai e saiu esse imbecil na minha frente...



Ana Carolina e Ivete Sangalo foram deixadas para o final por pura falta de memória ...

INFERNO

Desceu ao inferno. Permancendo por várias horas. Vários dias.
Sua vontade era estar ali por uma eternidade. Fraco subiu para um pouco de água.
Deu um gole, dois goles. Bebeu litros, metrós cúbicos. Voltou. Confortavelmente.
Lá embaixo o porrete o esperava. Foi ficando cansado, suando frio.
Lugar escuro, olhos fechados. Sem música.
A uma operação cirúrgica foi submetido. Resultado improvável.
Choque anafilático. Dentro do esperado.
Sua culpa de infância não enchia a boca do pote.
A cada pouco que morria despertava de si mesmo.
A cada minuto que passava, sua promessa calada estava sendo cumprida.

segunda-feira, 28 de julho de 2008

NATUREZA MORTA

A cozinha pode ser vista. Daquele restaurante cheio de frescura a cozinha se abre...uma janela de 50x50 centímetros. Por esse buraco vê-se três cozinheiras. Azulejo branco e panela preta. Vapor quente da mistura de gordura com doce. Folhas, muitas folhas. Os cabelos estão protegidos por uma tela. Todas no padrão limpeza. Avental branco e tela na cabeça. Enclausuradas na cozinha. Acostumadas aos mínimos detalhes daquele cubículo 2x2 metros. Quanto mais limpas, mais elogios da chefe. Como gostam desse elogio. Olham pela janela, clientes cheios de pose. São pavões assustadores. Limpar o polvo é tarefa melhor de fazer. Sem licença, a porta abre. São as ordens da chefe. Os corpos e gestos estão disciplinados. Prontos a atendê-la. Conformadas a um trabalho que paga 500 no fim do mês. Aquela prisão fedida paga o aluguel da casa. Lá no restaurante, som ambiente. Dentro do chiqueiro, sorriem alegres. Estão trabalhando. Na parede do fogão, o quadro de uma melancia cortada ao meio. Êta vida de bosta.

terça-feira, 22 de julho de 2008

PAUSA PARA ACREDITAR

Como contornar, delinear palavras onde não há certezas?
Como escolher uma a outra, em um lugar cuja incerteza habita impiedosamente?
Posso ver, sentir, cheirar e ouvir. Disto estou certo.
Sonhos, vontades e desejos. Ter a mim mais que eu tenho. Como?
Como superar a vergonha do ridículo?
Como não me confortar no ridículo de mim mesmo?
Recebo música, arte, como um egoísta, recebo.
Agradeço a vida que levo. É tão pouco?
Momentos, alguns que subelevo, me emociono,
Outros, descanso a alma. Não entrego, homem sem certeza.
Agarro-me ao excesso, agarro-me ao vazio. A cada instante, algo de mim prevalece.
Até um ponto que aconteça a palavra, ou a aceitação resignada...da morte?

sábado, 5 de julho de 2008

VELHICE

Dia 04de julho de 2008, puxa vida, achei que não ia viver por muito tempo. Tem remédio para tudo o que é dor. Tô velho e sem força. Os remédios me aliviam. São uns santos remédios para aplacar o peso da idade. Existem até pílulas que ajudam a rejuvenescer. O que por um lado é bom, pois vivo com menos dor que os velhos sentiam . Porém esse prolongamento da idade faz sentido para quem? Viver mais é necessariamente melhor? Será que não estamos em um circo armado em que todos somos cobaias? Ah, acho que tô velho demais para essas questões. Tenho um medo danado da morte. Vou viver como posso. Bem, como posso. Essas são as minhas fichas, Alea jacta est...

domingo, 29 de junho de 2008

TESO

Ele tá molhado. Ela tá molhada. O tesão só aumenta. O calor é intenso. Ela fica mole quando ele aperta o corpo dela. Ele é o Macho dela. Ela é Musa dele. Estão completamente fora de si. Acharam um lugar. Estão completamente dentro um do outro. Pelados. Gemem. Volúpia. Prazer. O calor e o barulho só aumentam. Explodem em Gozo. Tesudo, Safado....Deitam e se abraçam. Fazem um doce carinho. Suspiram até dormir.

quinta-feira, 12 de junho de 2008

Inside no Outside (Leminskiando)

Palavras, gestos e sorrisos
são meio dados a disfarces;
Olhos e olhares não escapam,
diz a(à) face.

segunda-feira, 9 de junho de 2008

HOMESTADO

Avistei o morro das meninas coloridas
Silenciei logo o barulho que faziam
Eram colchas de retalhos repartidas
Louras, negras e morenas se sentiam

Alto e forte fui ganhando em covardia
Em um ímpeto que a mim mesmo cabia
Pedi respeito como um porco saberia
Vigiei todo entardecer daquele dia

Como se fosse a minha última maldade
Expeli regras, mandamento, hipocrisia
Era demais reconhecer o que sabia
O pobre homem de direitos e mentiras

E uma hora já cansado desta vida
Parti perdido sem saber a quem servia
Me avisaram aos que aos outros se adia
É pro estado a força bruta que devia.

sábado, 31 de maio de 2008

NOITE FALADA

Uma noite de rua. Uma noite delegacia. Uma noite algemado. Uma noite desacato. Uma noite flagrante. Uma noite bandida. Uma noite porrada. Uma noite vitória. Uma noite suspense. Uma noite que esgota. Uma noite de marcas. Uma noite de sede. Uma noite de raiva. Uma noite de medo. Uma noite calhorda. Uma noite de grana. Uma noite cruel. Uma noite hierárquica. Uma noite burocrática. Uma noite de sangue. Uma noite de gangue. Uma noite de amor. Uma noite virada. Uma noite grávida. Uma noite. noite. noi..te.no...ite.diii..a. dii..a dia. Dia.

terça-feira, 27 de maio de 2008

IRMÃOS

Foram fazer aquela viagem combinada há 70 anos, quando ainda eram crianças. Naquela época gargalhavam no quarto escuro. Ignoravam a hora de dormir. Abafavam o barulho com as mãos na boca para a mãe não ouvir. Diziam que apesar do que acontecesse em suas vidas, bem velhos iriam viajar juntos. Iriam pegar estrada. Iriam subir uma montanha bem alta no meio do nada para conversar. Lá em cima, iriam contar suas histórias. Iriam silenciar contemplando o horizonte. Só os dois irmãos.
E viajaram. Como duas crianças velhas trocaram sorrisos de cumplicidade. Um era mais de ouvir. O outro, mais de falar. Um mais prudente que o outro. Um mais agitado que o outro. Continuavam os mesmos de 70 anos atrás. Apenas mais velhos. Com a vida passada pelos corpos. Com a pele alarmada por milhares de dias, noites, gostos, verdades e sujeiras. Falaram sobre angústia. Sobre o que não passou de um sonho. Sobre natureza e felicidade. Lamentos e fracassos. Lembraram dos filhos, amigos, futebol, livros, música e amores. Sobre a loucura que é a realidade. Voltaram no dia seguinte. Em silêncio. Pela mesma estrada. Estavam prontos para recolher a vida. Prontos pra morrer sem dor.

segunda-feira, 26 de maio de 2008

POESIA

POESIAPOESIAPOESIAPOESIAPOESIAPOESIAPOESIA, last and least,poesiaexistencial
poesiasurrealpoesiamarginalpoesiaclássicapoesiaconcretapoesiaeróticapoesiaromânticapoesiabeatpoesiarevolucionáriapoesiaburguesa.

TEZ

Em relevo,
Revela-me arte,
Vejo a ti, pele branca,
Profundez na superfície.

terça-feira, 20 de maio de 2008

CAMA

Sempre soube que era você. Você dizia que não. Estava confusa. Menina perdida brincando de adulta. Eu sabia quem era você. E lá se foi, altiva, organizar seus brinquedos. Fechou a porta. Dormiu. Eu não pude entrar. Esperei o dia seguinte. Um ano inteiro. Você enfrentou a alegria e anunciou que tinha medo. Navegou até aonde tinha fôlego. Uma praia de areia branca. Lá encontrou um, dois, quinze príncipes encantados. Folhas de Bananeira abanavam seu rosto leve. Sem imposição da vida. Sem uma nesga de dor. Experimentou frutas e comeu os frutos do mar salgado. Temperou o humor e o paladar com vinho. Aí você acordou. E era eu que estava ali do seu lado. Na cama. Pronto para te beijar. Não sabia se era um príncipe ou mendigo. Nem mais eu sabia quem era. Só queria te desejar, te sentir. Levei você para um lugar visceral, imundo.Terreno seco, duro. Desmanche de carros. E lá passamos pequenos apuros. Entramos sem saber a saída. E aí, foi eu quem acordei. E você não estava mais lá. Eu, sozinho, na cama. Acordei de novo, esfreguei os olhos. Nada de você. E fui acordando, acordando, tantas quanto necessárias, procurando jogar fora, qualquer réstia de sonho que insistisse em ficar. Consegui. Sobraram eu e você.

quarta-feira, 14 de maio de 2008

MELANCOLIA

Melancolia é colírio ardido para o sol de inverno,

Aditivo à tristeza, espreita o feliz vazio,

Conforma redemoinhos às avessas subindo à garganta,

Despede, lá no horizonte, de uma esperança cabisbaixa,

Apoderando-se de fantasias feridas, instante da dor.

sábado, 10 de maio de 2008

Era seu último dia. Acordou e foi ao banheiro. Assobiou canções preferidas, olhando no espelho amarelado, o rosto carregado de espuma. Barba feita, penteou o cabelo e pisou descalço na cozinha. Preparou café, abriu o jornal e lá estava, naquela foto que se achava feio, mas era a única que a imprensa dispunha a seu respeito. O prêmio pela sua cabeça havia dobrado. Achou exagero. Vestiu-se entre poucas e confortáveis escolhas. Tirou da gaveta os 100 reais que ainda restavam e decidiu viver bem por mais um dia. Por respeito ao aposento, deu duas voltas na fechadura e partiu. Abriu a portinhola do bar predileto e pediu o derradeiro prato: arroz, feijão, bife e salada. Palito nos dentes foi pro cinema. Assistiu a um bang-bang. Identificou-se com o coadjuvante que sofria secamente a perda do avô. Fim da sessão, sem pestanejar, parou na taberna para uma garrafa de conhaque. Bebeu sozinho. Cambaleante, a polícia o esperava na porta de casa. Abriu amigavelmente os braços, para melhor desfrute das balas da lei. Morreu sorrindo de uma vida bem aproveitada.

segunda-feira, 5 de maio de 2008

VIAGEM

O ônibus partia às quatro horas. A mala pesada carregava finalmente um prenúncio de vitória. Relâmpagos espocavam do céu cinzento. Entregou a passagem e foi logo pro fundo daquela podre carcaça. Um livro e a calça jeans surrada, parceiros de mais uma batalha. 5 horas era o tempo da espera. 5 horas, do que há muito importava. Chegou na cidade. Caminhou por atalhos conhecidos. Próximo de casa, parou no bar. Pediu uma cerveja. Lágrimas guardadas correram sujas pelo rosto. Desistiu. Voltou à rodoviária sem dizer "Te amo". Ficou duro demais para a velha esperança vencer novamente.

sábado, 3 de maio de 2008

PALAVRA - APROXIMAÇÃO

Alargar o esboço desapalavrado
Esmiuçá-lo ao fundo
Retirando os fora de lugar
Impregnando sujeito
Torcê-lo
Intuí-lo em quase-palavra
Observá-la por ângulos
Ela, a nós, indescrita
Juntá-la com outras
Entrelaçando,fraseá-la
Procurá-la, desespero da angústia
Ser acolhido
Proteger-se quando abrupta, despenca do coração
Espelho torto d'alma-momento
Possibilidade eu-encontro
Integrando-se a corrente da vida
Aconchego do eterno.

terça-feira, 29 de abril de 2008

Gordinho, esqueceu a chave de casa?

"Sexo Oral é 30. Não é porquê você é o Ronaldo que eu vou cobrar mais caro." (Frase de Andréa Albertini - Ex-André, na capa dos jornais cariocas, 1 dia após o enrosco que teve com o jogador no motel)

Ronaldo, muito tempo de Europa e você foi logo se esquecendo do nosso querido Brasilsão? Aqui é assim, vacilou, dançou. Travesti se traveste de mulher até o fim. Depois, se o cliente famoso e endinheirado for mudar de idéia terá que pagar muito para ter o bico calado. No corpo de Andréia está tatuado: Eu sou um sucesso. Gordinho, aqui não tem engrandecimentos espirituais como no primeiro mundo. Aproveitaram do teu prestígio. Ser famoso corre muito risco por essas bandas. Privacidade? Sexo oral é 30 reais. 10 euros. Nem mais nem menos. O preço é o mesmo para jogador ou torcedor. Agora, não vai negar essa honra. Desperta esperteza. Aí, o preço muda. Foi prá 50 mil. Ronaldo, tomou chá de esquecimento? O império da necessidade misturou com o da banalidade. O leitmotiv é a rala grana midiática que corre por aqui . Ele diz que foi extorquido. Ela, ameaçada. A chantagem está bem infiltrada nas relações sociais.
Gordinho, esqueceste que aqui toda atenção é pouca? Se você tem grana e fama, tua atenção deve ser redobrada. Literalmente, Andréa quase enfiaste...
Porém, você só queria se divertir. Relaxar. E pagar um preço justo. Brasileiro negocia preço de foda. Tudo se barganha, Tanto para ir para cama ou deixar prá lá. Mas não prá você, Gordinho. É 5O mil ou capa no dia seguinte. No mundo real, este é o preço do teu passe.

quinta-feira, 24 de abril de 2008

CULTURA LIBERTÁRIA

"Falta de cultura para cuspir na estrutura." Foi uma das formas que Raul Seixas expressou através da letra de uma de suas músicas a indignação com a nossa cultura bunda-mole.
A mídia de massa oferece ao público programas que reforçam valores pífios tais como:
- riqueza, sinônimo de felicidade;
- maniqueísmo. Certo ou errado, sem nuançes;
- Legal é ser igual e superficial;
- Rótulos e Estereótipos.
O teatro e o cinema, em geral, são caros. O povo influenciado pela mídia, quanto tem dinheiro irá assistir aos espetáculos calçados nos valores acima citados .
O Brasil não possui um caldo de leitura para que as pessoas possam relativizar vidas, captando diferenças, sutilezas e sensibilidade. Primeiro, pois livro ainda é caro, exceto em sebo. Segundo, há uma tradição oral que permanece. Vide quaquer viagem de metrô ou ônibus pelas grandes cidades. Terceiro, pois não há educação de leitura transmitida de geração para geração.
Diante deste cenário, uma cultura libertária, autônoma e independente situa-se a margem desta corrente única. É o créu, a novela das oito como todos os absolutismos e estereótipos possíveis, a máfia do dendê e do acarjé mandando ver.
Reflexo emblemático é o Sr. Lima Duarte.
Há um ano atrás, este Sr., concedeu ema entrevista ao jornal Folha de São Paulo dizendo que faz merchandising e fica "puto" da vida. Que acha aviltante. Que faz novela e acha tudo uma porcaria e só faz porque é ator da tv globo.
Quando li, pensei que antes tarde do que nunca. Apesar de que com 76 nas costas é mais fácil do que com 30, 40 e 50. Mas não é que dois dias depois ele envia uma carta, pressionado ou não, dizendo que estava nervoso (sic) e que aquilo dito na integra não era o que pensava.
Triste, Sr. Lima, muito triste viver assim.
E assim os caminhos do coração, de uma cultura essencial, não-pasteurizada estão isolados em pequenos grupos. E o povo, como o Sr. Lima, vão envelhecendo e morrendo, sem a condição de expressarem suas próprias opiniões. Ou por falta de acesso, ou desrespeito consigo mesmo.

sábado, 19 de abril de 2008

FRONTEIRA

O silêncio à procura
De limites ampliados
Esvaindo-se em abraços
Congelados, per supuesto
Paulatinos transformaram
Na saída do passado

Pô-lo de lado
Assumindo companheiro
O contorno se encerra
Acariciando movimento
Que disforme no espaço
Não lhe ousa resultado

Para assim silenciá-lo
Permitindo na fronteira
O início da palavra.

terça-feira, 15 de abril de 2008

BESTAS

Há um diabo açoitando. Contorce a lateral das costas. Vira o pescoço. Faz o queixo tremer. Não olha. Nem consente. Tangencia. Nega.
Há outro diabo.
Os diabos são postos no ringue. Sem fuga. Trocam socos, chutes. Agressões mútuas. Múltiplas. Derramam sangue. Derramam lágrimas. Estão machucados. Estão treinados. Um dia quem sabe apuram a porrada prescindindo-se dela. Ou juntos, eternamente diabólicos...

segunda-feira, 14 de abril de 2008

COVA É UMA OVA

“Para ser coveiro tem que ser bom de buraco”. Essa era frase que Seu Luís, 30 anos de cova , se apresentava. Arranjou trabalho no cemitério por necessidade. Ali, foi seu primeiro e último ofício.
O começo não foi as mil maravilhas . Envergonhado, dizia que trabalhava na floricultura da frente. Depois acostumou e abria o jogo para quem perguntasse. Não tinha muito orgulho, mas, ufa, já podia falar o que fazia.
O tempo também ajudou acostumar a não se preocupar com morto. No início, tinha receio do defunto se mexer. Depois, foi esclarecido pela gerência que sua função era abrir e fechar cova. E só. Qualquer problema com o morto é problema do próprio...Bem, era problema da família ou do IML.
Religioso na juventude,o tempo foi passando e aquele fervor, desaparecendo. Separar o que é carne, matéria bruta do seu trabalho, do que é espírito, que ele nunca via, era muita criatividade do bicho homem.
Seu Luís foi ficando velho. Precisaria de muitas vidas para pagar sua cova. Tinha um lema para descansar em paz :”Cova é uma ova.” Além da falta de grana, não era de misturar vida pessoal com profissional. Deixava isso para os políticos.
Em uma quarta-feira não foi ao cemitério. Havia morrido. Mesmo assim seus amigos de labuta o esperavam. Agora como cliente. Mas foi cumprir seu lema. Cremado. Suas cinzas foram jogadas no buraquinho que fez no fundo de casa.

sexta-feira, 11 de abril de 2008

EDITORA ABRIL, puta que pariu, que editorazinha...

Revista especializada para o público juvenil, Super Interessante - Editora Abril - emplaca na capa do mês Abril/08 :

O BRASIL SURREAL QUE DOM JOÂO ENCONTROU - Negros donos de escravos em Minas, chuvas de esgoto em Salvador e um índio rei da Amazônia. De norte a sul, uma viagem pelo inacreditável país que existia antes de 1808.
Junto ao escrito, em primeiro plano, um desenho de Dom João assustado com o que vira.

O Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa regista surreal como: "o que denota estranheza, transgressão da verdade sensível, da razão; como nome, significa aquilo que se encontra para além do real."
Para quem vinha da europa, todo aquele Brasil causava estranheza, trangressão, além do real.
Portanto, o título é coerente com a visão de Dom João vindo além-mar para terras brasilis.
Porém, seria também surreal ou inacreditável para negros e índios a vinda de um Dom João esquisitíssimo aos olhos dele. A capa, no caso, seria: "Um Portuga surreal que o Brasil encontrou". Muda tudo, não muda?
A revista da editora abril é perversa quando se alinha ao olhar e discurso de quem vem de fora para cá. Perverso, por se alinhar a um discurso que é o dominante. O dominado, no caso, o surreal, são os negros, o índio e o esgoto. Perverso, por se alinhar ao discurso de apenas um lado. Como sempre, "chapa branca", o do mais forte
Interessante como junta aos negros e indios, o esgoto, como o país que existia até então. Mais perverso, impossível.
Perversão, o dicionário define como a “passagem moral do bem para o mal, o tornar mau, corromper, desmoralizar, degradar, alterar, desnaturar, desvirtuar”. Nada como essa análise elementar para revelar a perversão deste veículo de comunicação, que como todos, é uma concessão do estado.

quarta-feira, 9 de abril de 2008

JOGO SUJO

Não dá para perder tempo. A vida passa rápido. Você precisa ser gênio e feliz logo. Se não, tá condenado. Fracassado, Looser. Tem que achar sua especialidade. Saber qual é seu potencial. Rápido, Urgente. Se perder o trem, envelhece e dança. Tem que se garantir. Você vai ser cobrado por isso. Ninguém te perdoará. A escola vem te preparando há tempo. Não tem desculpa. Ninguém vai querer te ouvir. Quem pegou o trem vai ser empurrado para fora a todo momento. Vai ter que resistir até o fim da vida. Genialidade, felicidade e sucesso são para poucos. Mas quem deixou ele passar, vai criar sua própria ilusão. Um Barato. Singular lado B.

sábado, 5 de abril de 2008

RÔMULO

Não dá para falar do Rômulo de qualquer jeito. Precisa-se de acuidade e respeito para revelar as nuanças desta grande figura. Hoje, nos seus 58 anos, tem a juventude madura batendo no peito.
Rômulo combateu a ditadura. Fez assaltos para revolução. Espírito da contracultura, usava longos cabelos e roupas coloridas. Feriu o Estado nas duas balanças. Pelo lado político e do comportamento. Era demais um homem como esse. Foi preso 32 vezes.
Figura carimbada do bairro que nasceu e vive até hoje - Maria das Graças, Rômulo tem um estilo notoriamente tranquilo sem mais os arrombos de antigamente. Não que o mundo tenha mudado, mas hoje esse professor de francês e português, atua sutilmente nas pequenas revoluções que faz por onde anda. Vegetariano desde os 15 anos, é um resistente.
Uma frase de um livro que leu ou uma cena do filme que viu são agraciadas por ele ao expô-las em toda docilidade ou crueza devida, combatendo a pobreza de espírito e a vulgaridade que assola os dias atuais.
O vento batendo na janela de uma forma especial nutre Rômulo por alguns dias. Ele nunca precisou de muito. Do que precisa, poucos podem ver.
Caro Rômulo, seu caminho é tortuoso, mas apaixonante. E como você sempre diz em tom
enfático, palavras precisas de um esgrimista :
Breno, tá cada vez mais difícil! Mantemos o equilíbrio, sem trair nossos valores!
Amigo, tua vida, vale quanto pesa.

terça-feira, 1 de abril de 2008

ALVINHO

Álvaro é garçom do Café Empório, uma cafeteria cheia de frescura. Usa um avental preto escrito no centro em dourado: "Golden". No cabelo, o gel faz um pequeno topete na cabeça achatada. Bikers desfilam suas máquinas parando para um café-da-manhã. Estão ornamentados de capacetes prateados, roupas, joelheiras e sapatos coloridos. Para Alvinho, são seres extra-terrestres despencando de outro planeta para refeição matutina.
Não foi dado a Álvaro a possibilidade de ser criativo. Seus olhos verdes, longínquos, deixaram há muito tempo de sonhar. O máximo de ousadia é algum gracejo que repercuta em maior consumo do cliente. O chefe de Álvaro mede cada gesto do empregado. Qualquer manifestação mais brusca de Alvinho é rechaçado na surdina pelo chefe com um "achei que você tinha melhorado!". Há uma energia criadora contida no pequeno espaço que trabalha.
Naquele palco, Álvaro tem que falar baixo, pausado, em harmonia com o chorinho suave que ecoa da pequena caixa de som.
Para os amigos, no fim-de-semana, conta cheio de orgulho que só atende gente grã-fina e tem aprendido muito com a convivência.
Na segunda de manhã, vai ao trabalho "puto da vida", por representar mais uma semana - o teatro do absurdo.

sábado, 29 de março de 2008

SONHO

Cláudio vende carnê do baú da felicidade. Feito seu chefe , sorri , afaga a dona-de-casa e depois de contar sobre os milhões que ela pode ganhar deixa pro final a cereja do bolo - Sílvio Santos vai ligar para a sua casa agradecendo ao carnê adquirido. A gravação da voz de Sílvio já vale como prêmio. Cláudio tem 22 anos. Não gosta do que faz. Apesar de fazer bem. No caminho até o trabalho fica intrigado pensando que o que vende é sonho. Alivia ao lembrar que é o mesmo que vende o arquiteto, escritor ou o padeiro. Alivia ainda mais ratificando que é o que todo mundo vende. Cláudio só acha que ganha pouco. Aí, o negócio é real.
Cláudio soube um dia que Sílvio foi expulso como camelô e foi tentar rádio e tv. Admira a coragem do patrão além das cores do início de Hollywood nos cenários do programa.
O que não admira é trabalho de garçom. Cláudio implica dizendo que o trabalho é moleza e que ele faria aquilo com os “pés nas costas”. Mal sabia que suas recorrentes faltas para ficar namorando, bebendo no botequim e sacaneando garçom, levariam a sua demissão. Avisou a família que era contenção de despesas do patrão. Deixou a ilusão de Sílvio e do carnê de lado. Ou melhor, foi mudar de vida. Mas garçom ele não ia ser. Preferiu o tráfico. Dinheiro rápido sem ilusão boba. Hoje vende droga no morro que sempre morou. Prá sonhar, comprou carnê dia desses. Se vingou. Desligou na cara do antigo patrão.

sexta-feira, 28 de março de 2008

DOR

Tem uma hora que a dor esmaga em um misto de sangue e carne. O peito de quem está ao redor também é esmagado. O que era vivo está morto. Não há espaço para dúvida. O que começou há muito tempo atrás acabou hoje. Duas crianças ficaram orfãs. O tempo da mãe venceu o prazo. Aqui na terra é assim. É um nasce e morre, nasce e morre desgraçado. Infernal. Ela acordou hoje e se foi, violentamente. Para uma, que ninguém sabe qual é.

quinta-feira, 27 de março de 2008

Realidade Ilusória

Tudo é tão estúpido. Tudo é tão covarde. Não poderia ser diferente. Há uma máquina indestrutível: A Vida. No meio de tudo isso sai um sorriso. Como assim? A multidão fala sozinha. Pessoas enlouquecem passando-se por "normal". Viver é ilusão. É sonho. Sem ilusão, tudo acaba. A ilusão de peitos e bundas. A ilusão de juntar dinheiro e deixar para os filhos. A ilusão de viver o que viu no filme ou leu no livro. Enquando houver ilusão, há vida. Esperança, morreu de velho.

quarta-feira, 26 de março de 2008

TV GLOBO

Moro perto da TV Globo. Isso me envergonha. O Pedro Bial mora quase em frente de onde moro. Me envergonho ainda mais. O símbolo da Globo me dá nojo. A Globo é uma máquina ideológica que desde os militares lava o cérebro dos brasileiros. Isto não posso tolerar. Como o poder está do lado da TV há grande chance de eu ser chamado de radical, extremista. Mas foda-se, moro nesse lugar porque a minha mulher já morava aqui e tem natureza prá caralho. Se eu pudesse jogaria uma bomba na TV Globo. Mas sou covarde e não tão radical e extremista como gostariam.

domingo, 23 de março de 2008

AMIGOS

Há um diálogo tenso no Bar. Pouca luz, madrugada. Homens e Mulheres esgarçam a alma à procura de suas existências.
Oscar e Adauto são homens à beira dos 40 anos. Com a pele talhada e olhos cansados descobriram na vida que tempo é um negócio sem sentido e o que dói é do tamanho da dor.

Oscar: Parece que a gente tá sempre se preparando para o amanhã? Só não sei a mando de quem?

Adauto: Cara, fica na tua. Te conheço há 25 anos. Onde é que tá tua veia? Teu sangue tá escorrendo prá onde? Toma esse conhaque. Somos amigos e por isso, você conhece minha vida. Sabe que não acredito em jardim florido, mas você tá querendo se ferir com faca sem corte.

Oscar: Porra, tá uma puta barra para mim. Problemas prá caralho que existem mais ainda os que eu invento. Não tô conseguindo sair dessa.

Adauto: Tua dor é solitária! O fogo que te consome é egoísta e não adianta atacar o pior inimigo que só vai piorar.

Oscar: Só não entendo como tu consegue ainda ter esperança.

Adauto: Esperança, não! Faço meu trilho cheio de barreiras, também não acredito nessa porra toda! Tô triste...minha mulher me deixou

(Silêncio)

Oscar: Vocês sempre se amaram.

Adauto : Amei, você bem que disse. Amor foi feito prá quem é forte. Não para mim!
(Chorando)

Oscar abraça o amigo pelo pescoço e também chorando diz:

Oscar: Viver, na real, é uma ficção de merda.
(chorando)

Adauto: Todos os problemas acabaram. Só sinto a falta dela. Vou embora, Oscar. Só saio de casa agora se for para chorar.

Oscar : Vai nessa Adauto. Te considero prá caralho. Fico por aqui, esperando o amanhecer prá ver se o tempo muda de vez.

terça-feira, 18 de março de 2008

RESPEITO EM VIDA

Vejo na padaria pela manhã, apresentadores na tv fazendo jogo babacas, conversando imbecilidades, sorrindo para as câmeras. O que mobiliza essas pessoas a este papel deplorável?Dinheiro não, pois recebm cachês altíssimos ganhando o que precisam e o que não precisam. Necessidades de sucesso, poder? Talvez.
Acho que assim como aprendemos a amarrar o sapato ou comer de garfo e faca ,deveríamos desde pequeno ter uma pergunta óbvia e direta em nossas mentes: " Quando eu estiver morto, como você quer ser reconhecido?" Se a resposta condizer com seu atos diários, maravilha. Não há juízos de valores sobre tais atos, quaiquer que sejam,mas a pergunta deveria ser feita.

TRABALHO SEM ROSTO

Carregando com seu próprio corpo, tábuas ou cartazes de propaganda, alguns seres humanos no centro de sp ou rj, atingem um dos graus mais altos da degeneração humana.
São anteparos, apoios, para que alguma coisa seja vendida,comercializada. Estas pessoas não devem aparecer, de preferência, devem ficar imóveis. O movimento do sujeito atrapalha o objeto. Ser sujeito compete neste caso, com o verdadeiro protagonista da história: o objeto.
Menos evidente, não seria isso mesmo o que grande parte dos trabalhadores fazem diariamente?

SINCERIDADE

Não podem as pessoas fracas ser sinceras. Isso não é meu. É do La Rochefoucault. Mas poderia ser de qualquer um. Sinceridade sem vaidade é aprendizado. Pessoas fracas precisam se esconder. Pessoas fracas precisam ser fortes. Sinceridade não se compra na farmácia, muito menos é matéria de escola. Sinceridade é coisa para não se pensar. Quem pensa joga. Quem joga, quer vencer. Sinceridade é singular. Não se compete, não se ganha, se aprende.

domingo, 9 de março de 2008

QUE PAZ?

Ela tinha 27 anos. Foi assassinada quinta-feira as 22:30 na favela Cidade de Deus enquanto lavava o uniforme de escola da filha. Recebeu dois tiros fatais de policiais com suas miras caolhas. O alvo eram outros. O alvo é a morte patrocinada pelo governo de Sérgio Cabral e sua polícia assassina. Uma polícia que mata mais do que um carandiru por mês nas favelas sob o silêncio soturno carioca. O Estado tem o monopólio da força. Questão de droga é questão de saúde. Vidas são ceifadas dia a dia em um combate vão contra as drogas. Só restam contas, números , estatísticas comparativas, gráficos. Precisam morrer quantos mais para perceber que a luta contra o tráfico é uma luta tola, insana que não acaba nunca se for tratada com força. Para a sociedade que pede paz, saiba que ela só vem com educação , saúde e amor. Paz é consequência e não princípio. Se a polícia continuar com estratégia de guerra, a paz tão pedida é discurso vazio pelas praias de ipanema. A não ser que a paz seja alcançada dizimando a população do morro. Aí é questão de nomenclatura e eu tenho um outro nome para isso.

Desse Jeito

Gosto de ler e escrever cedo no bar. Super Burguer na gávea ou Calamres no Horto são alguns deles. Sartre tinha esse prazer. Tem uma molecada que sai da escola e está sempre lá. É um sacaneando o outro. É bom ficar ao fundo olhando a esquina e o movimento do bar. Bares que tem o preço justo e o público honesto. Também aprecio preço honesto e o público justo. Ganhei uma grana trabalhando muitos anos em algumas empresas. larguei tudo. Tenho 33 anos. Essa grana dá pra viver mais um tempo sem trabalhar. Viver vagabundeando pelas esquinas. Logo volto a fazer alguma coisa que me dê tesão. Adoro arroz e feijão. Sem frescura. Fiz faculdade de economia. Papilto sobre o assunto. Acho que assim mesmo que todos fazem nessa área. Acho um saco me apresentar linear como economista, hetero,moro no rio de janeiro. Se é para rotular, prefiro como um cara sem memória, que gosta de sexo, leitor de Goethe e Allan Sieber e tô sempre do lado do mais fraco.

sexta-feira, 7 de março de 2008

VELHA CRIANÇA

É que o menino se distrai e vira homem;
O sonho antes sonhado, agora vai ser desenhado;
A mãe retira as vestes de deusa;
Assume contornos de mulher;
Assim, a velha criança vai crescendo;
Encontrando ainda mais perguntas sem respostas;
Colocando outra vez aquela camiza azul desbotada;
Brinca sozinha com seus mundos interiores;
Mas hoje há no peito, uma dor de ilusão.

terça-feira, 4 de março de 2008

MÂE

Leio A Mãe de Máximo Górki. Que mãe corajosa. Lembro da minha mãe. Uma mãe que tem a esperança dentro dela. Uma mãe que faz o que pode e o que não pode pela família.
Uma mulher bonita que vibra com os menores ganhos que a vida lhe proporciona. Uma mulher de fibra que não desiste de nada facilmente.
Um dia, eu era pequeno, vi minha mãe arrumando vários presentes de natal para as ajudantes que cuidavam do meu avô já debilitado e também contribuiam para a ceia. Ela não ia gostar de ver toda a família classe-média trocando presentes e não as ajudantes. Ela nunca fez distinção alguma. Tem a sensibilidade de olhar para o outro. Aprendi generosidade com ela.
Um verdadeiro beijo para a minha mãe. Ou para a Bãrby. Tanto faz...Ela entende.

sábado, 1 de março de 2008

Americanos Brasileiros

A fumaça do café sobe pela xícara. A guitarra distorcida de Jeff Beck procura a alma.
Voz ao fundo de uma loura criança conversa com bonecas e sonhos.
Somos Brasileiros, somos América também.
Quadrinhos de Robert Crumb desnudam com humor adulto os fantasmas interiores.
E assim o sábado vai passando no Rio de Janeiro ou em Cleveland.
A chuva escorre pela janela e o clima cinzento sem barulho anuncia uma mansidão levemente entristecida. A vida não são flores e nem foi a maturidade que chegou.

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

PALAVRAS AMENAS APENAS

A palavra, vazia, hoje em dia, não faz sentido.
Jogada de cá pra lá, de lá pra cá, virou rotina obrigatória.
Ninguém consegue suprimí-la,
É que a angústia do silêncio angustia.
O tempo passa, as palavras correm solta.
Sem peso, sem cheiro, cheias de estilo pra agradar,
Palavras ditas pelo sabor do momento
Palavras sem compromisso do dono
Palavras a beira de um abismo em extinção
Correr o risco pela palavra é antiquado.
Palavras-brisas, leves sem a substância própria que lhe formou.
Palavras café descafeínado.
Palavras para não ofender. Palavras para não doer.
Palavras para divertir. Taí, palavras entretenimento.
Palavras que não toquem em ponto desconfortável e despertem para um novo patamar. Palavras cobertor, palavras conforto.
Palavras que evitem o conflito. Palavras alívio.
Palavras não são mais a seiva, agora o barato bobo são as palavras flor.
Palavras multiplicidade.

domingo, 24 de fevereiro de 2008

Sonho Acordado

Saber-se fragmentado sem perder espinha dorsal,

Saber-se mal amado sem perder elegância formal,

Saber-se imbecil sem perder luz no final,

Saber-se menino sem perder a seriedade da dor,

Saber-se calado sem perder a opinião que lhe dou,

Saber-se mais velho sem perder a ilusão da cor,

Saber-se gigante sem perder a condição do amor,

E aí chorar baixinho para se ouvir melhor,

Chorar no chuveiro para secar a voz,

Chorar tanto, até ficar só,

Para enfim, dormir como ferido em paz,

Dormir sem sonhar, que sonho ficou para trás.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Cuspida Seca

Você fica escrevendo, para acreditar no que escreve. Critica querendo acreditar na sua crítica. No fundo, se conhece bem. Bem menos do que gostaria. Você compreende e sabe que isso não é o bastante. Sonha porquê só assim dá prá viver. Você agora não faz literatura e avisa. Você agora não faz forma sem saber. Você faz tudo por você. Acha isso o máximo. Você quer se encontrar. E briga por isso sempre. Muitas vezes enrola um pouco a vida pois tomar decisão não é fácil. A inércia do que já está, tem sua força reconhecida até na física (um pouco de literatura nesta cuspida seca).
Você é ou são personagens. Você sabe as reais que pode entrar. Sabe o valor da maconha, do álcool e da aparente normalidade. A maconha ajuda a não esquecermos nossos medos. A normalidade de não se esquecer e o álcool de acreditar que vale a pena viver.
Você acredita no seu egoísmo. E busca o belo a todo custo. Você quer ser eterno. E disso não abre mão. Você não acredita em morrer em paz. Acredita na dor.
Se emputece com sua covardia. Essa covardia não é a que todo mundo diz. Ela é só sua. Você não entende que o mundo é que manda e não você. Você é vaidoso e precisa de aplausos. As dores para você sempre te ajudaram. Dores que te colocam no eixo.
Você se perde na musicalidade das palavras. Se perde também no silêncio. Você reconhece seu ego na aprovação do outro. Confia como um cego no entendimento comum sobre as coisas. Você não sabe de quê lado está o bem e o mal. Você não sabe de quê lado está. Você não quer perder nunca. Você quer ser o sujeito.
Ainda que haja tudo isso, tenta, como poucos, acertar e não deixa de amar e valorizar a vida em sua dimensão mais banal.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Juizo Final

-Já disse que mal não se corta pela raiz, mas se poda dia a dia com dedicação e saco!
Com essa frase, Aristides se despediu da babá que insistentemente reclamava da traquinagens da filha dele.
Pegou seu carro e foi para o trabalho depois de um almoço em casa cheio de turbulências.

O negócio é que do outro lado da cidade, Joninhas não queria nem saber. Tinha acabado de acordar. O barraco parecia se derreter pelo sol e hoje não podia ter folga. Era dia de ser malvado e garantir o adianto.

A tarde de Aristides foi regada a muito carimbo, algumas ordens, sorrisos forçados e cafés cheios de adoçante.

A de Joninhas, foi comer carambolas embaixo da árvore, pendurar uma cerveja na birosca do Edgar e esperar Julinha para ver o pôr-do-sol já armando qual seria o barato da noite.

De noite ,Aristides pega filha e a leva para jantar. Depois de muita comida ,bebida e sobremesa, já empanturrados, pega a chave do carro com o segurança e parte para seu doce lar.
Porém não imaginava que Joninhas estava no seu caminho. O menor, ao lado de Julinha dispara três tiros fatais em Aristides quando esse chegava no portão de sua casa. A filha, berrando , foi largada no portão e Joninhas partiu assustado com aquela máquina para algum desmanche da madrugada.

domingo, 17 de fevereiro de 2008

Arrumação

Ela estava no metrô. Olhando para porta de saída, essa mulher frágil, negra e grávida, de segunda a sábado trabalha de faxineira. Um repórter lhe pergunta o porquê dela se vestir com primor e cuidado admirável.
- Eu me arrumo, pois é aí que eu me seguro. Se não me arrumo nada faz sentido. Só quem tem o mínimo não se preocupa em se arrumar.
A cada bofetada da vida eu respondo com meus brincos, a cada humilhação que recebo devolvo com minha reluzente sandália. Ninguém segura meu perfume. Ele exala e me liberta.
Eu me arrumo pelos meus filhos e para esse que vem vindo. Eu me arrumo por dignidade.
Nada da vida me dói. É assim que eu me visto.

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

TUBO

Seis da tarde. O noticiário televisivo despenca casos de violência ocorridos em várias partes da cidade. Seis pessoas sentadas não piscam, estão todos com seus corpos imersos na violência produzida pelo tubo. Mesas apontam como um canhão para o tubo.
Em uma mesa mais afastada, um casal divaga assuntos prosaicos.
As seis pessoas se impressionam com o roubo a banco do outro lado da cidade. Olham para o tubo. O tubo assusta e não mente. O casal da mesa mais afastada papeia sobre a diva Marylin Monroe. Um beijo de cumplicidade. Seis pessoas estão entubadas recebendo notícias violentas. Sentem o impacto das notícias espetaculares, ficam abaladas. Não conversam, de vez em quando soltam no ar um "filho da puta". São receptores das notícias geradas pelo tubo. O casal da mesa mais afastada lembra de como a vida tem seus momentos tristes e felizes. Buscam perguntas e respostas, vão atrás. A notícia violenta termina, os homens-receptores relaxam pois é a hora de ver os gols do fim-de-semana. O Tubo não falha.

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Estética e Amizade parte I

Amizade é aquilo que sinto em boas conversas na mesa de bar.
Variando o papo entre amor, dor, vida, sociedade, cinema, ciência, o amigo completa o que me falta. O silêncio consentido nos acalma. A cerveja dividida nos afaga. A discordância do amigo excita e nos faz repensar.
Neste clima ouvi do ótimo amigo Rômulo uma definição de estética a partir de suas leituras do século dezenove, como a "forma que você sente".
Portanto, mesa de bar com amigo é uma solução estética que gosto. Mas não é qualquer bar, estou bem nos botecos em que cerveja de garrafa é vendida, o bar é extensão da casa, com mesas e cadeiras para poder beber, conversar e viajar.
É bom conhecer a estética própria que nos potencializa como ser humano. Não sendo a solução estética própria, estaremos pela metade e portanto nossa potência humana não será exercida plenamente.
Se estou em uma choperia não é uma solução estética que me agrada. A idéia individual do chopp, o garçom em uma sede de enfiar mais chopps goela abaixo, o sentimento de profissionalismo me incomoda. Em compensação o Elite bar em Maria das Graças...Porém para muitos, a choperia se encaixa perfeitamente, talvez por outras questões estéticas como o ambiente "clean", pessoas "bonitas" (sic)...
A estética possui um caráter pessoal, a forma que cada um se assujeita (dei uma de Guimarães Rosa) no mundo , faz com que nos identifiquemos com determinado olhar. Portanto a forma estética concretizada no Elite bar que me agrada deve-se aos valores constituídos ali que me fazem sentir bem, os quais seriam: o olhar natiural das pessoas sem pose, a idéia solidária da cerveja, a possibilidade de sentar na calçada e papear, a sinceridade do subúrbio, a paixão pelo popular.
Nesse vagar, vamos construindo concepções estéticas em nossas vidas. Mais do que o boteco , cada um possui no seu âmago uma estética para casa , para mulher, etc..
Inteireza potente é aderir o olhar estético pessoal com a realidade cotidiana.
Este assunto deveria ser mais popularizado. Como disse mais ou menos assim, a formidável Clarice Lispector: " muitas vezes compreendemos uma palavra que até então não conhecíamos seu significado e a partir deste momento novas visões de mundo são adicionadas, transformando as visões já existentes".

terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

Inebriado

Ela vem com os filhos. Seus filhos são meus filhos. Mas para eles, não sou seu pai. Eles têm seus pais. Ela me ama. Nos conhecemos e foi muito forte. Decidimos viver juntos no primeiro mês de encontro. Os amigos pediram cautela. Eles querem o nosso melhor. Ela apóia meus sonhos. Eu apóio os dela. Ela sabe quem eu sou . Eu sei quem é ela . E isso nos une. Nos faz querer estar próximos. Ela topa mudanças. Topa porquê acredita em mim. Sabemos que vida é para ser vivida no dia-a-dia. Não queremos trair nossos valores. Nem buscar alívio através da mentira. Fazemos festa por jantar arroz com ovo frito. Não precisamos ir a Paris de avião. A expectativa por uma viagem de ônibus para ilha do mel é a nossa vida. A felicidade está dentro da gente.
A gente é assim. Não é o caminho que o mundo caminha. Mas é o nosso. E isso que importa.Ela acredita na simplicidade e no amor. Eu acredito nela. Ela faz o que acredita. Paga um alto preço por isso. Mas nunca abaixa a cabeça. Por essas e outras , é a minha mulher. A mulher que eu amo.

terça-feira, 29 de janeiro de 2008

Imagens cheias de senso ( seria non non-sense?)

Multidão assonada levanta para trabalhar.
A música do despertador é ruim , o sono é bom. O trabalho, geralmente, é chato.

Mulher furta chocolates no supermercado de dia e à noite cuida de velhinha desamparada.

Perua faz generosas caridades aos asilos e maltrata em casa a faxineira.
- Minha vocação é pastora e não enfermeira! repete com a veemência de quem sabe o que fala.

Irmãos conversando. São garotos trabalhadores sonhando com um mundo melhor.
Um comenta sobre a surra que o tio deu na tia, interrompido gentilmente pelo outro, pedindo a mantega do lado da mesa.

Menino arteiro não é compreendido pela família que o leva ao psicanalista. O cachorro já o sacava, humano.

Pessoas almoçam sem fome, mentem para si mesmo, sorriem com força, brigam sem motivo .
Ainda que sofram quando dói.

Pesquisa na frente do museu para saber se o aumento da frequência de visitantes deve-se à exposição do momento ou ao frisson causado pelo roubo de dias atrás.

Homem veste-se do seu time de futebol, escraviza o filho pro mesmo time, tv paga para ver os jogos e sonha com a esposa vestida sensualmente com a roupa do seu maior rival.

Homem mata a mulher grávida e o futuro bebê com tiros precisos na barriga da gestante. O filho era dele. O motivo recôndito: mistura de cachaça com farda de general.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Juntos

Anônimos, trocaram sorrisos

Tímidos, se encontraram

Sabiam o que sentiam

Apesar do bom senso dos amigos

E não escondiam segredos de ninguém

Cabendo ao mundo conhecê-los

A palavra "passado" foi esquecida

Acreditando que vida não se constrói

Flor não precisa ser perfeita

E comida pode ter pouco sal

O cheiro do outro apagava as palavras

Embaçava o céu

Na dispensa, macarrão e cerveja

Sobre amor, um copo de água à dois

Finalmente, admitiam não sonhar.

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

Miséria

Guerra Fratricida
Centro da vida
Explode Uruguaiana
Rio de lágrimas
Sujeira camarada

Na presidente vargas, centro do rio, vagabundo dorme enfileirado. Tem que dormir e não sonhar. Se delirar é melhor não acordar. Tem que ouvir, vai fazer o quê? É muito pobre! Não tem solução!
E não pode rir nem chorar. Se chorar, vai apanhar. O papo é viver. E viver com as glórias que a vida dá. Já falei que não pode sonhar. O lance é comer, engolir, parir.
De dia , é fugir. A natureza só fode, se não é a merda da chuva, é a porra do sol na cara. Nunca ajuda!
Tem que garantir o sustento nas migalhas. Nisso, o capitalismo é camarada. Diz que é bom, cresce e distribui. Rola até pedaço de macdonalds no lixo.
Lixo do centro é nutritivo. Tem qualidade. O ruim é que o pessoal não ajuda, não separa o que se aproveita do que não se aproveita. Não aproveita, pra gente, é comida estragada. O reciclável não incomoda, se não quiser separar, não precisa. Pensar ecologia é tá de barriga cheia. A noite, fumando um cigarro vagabundo a gente pensa cobrindo os pés do vento frio que esses putos não sentem fechado nas suas paredes. Sei que somos revoltados, vai entender.
Briga é alimento pra alma. Vira e mexe a porrada come. A diversão é que vai formando grupos. Líder bêbado sempre se fode. Uns são mais folgados, outros menos. Tem neguinho querendo levar vantagem em tudo. Não basta ter espaço garantido, quer sombra e água fresca. Só pensa nele. Depois que morre não tem com quem reclamar. As vezes vem uma galera dar comida. Tem filho da puta que não tem mais fome, mas continua comendo. São uns porras de uns gulosos. Acham que pode virar reserva pro dia seguinte. Será que não sabem que tudo vira merda fedida nos becos. No dia seguinte, esse povinho trabalhador reclama que o cheiro na cidade tá muito ruim. Quando a gente come bem, eles reclamam? Vai entender. São um bando de gente responsável. Acordam cedo, andam rápido. São tudo trabalhador, diferente de nós, que até gostaria de sair daqui mas não conseguimos. Vai ver que a gente tem algum problema na cabeça ou foi deus que quis. Ainda bem que tem deus , se não tivesse a gente tava fudido, não vinha nem pra essa vida. Como ia ter vida sem a gente? O pessoal ia ter pena de quem? Deus sabe das coisas. Amém.

domingo, 13 de janeiro de 2008

Amor, a não- palavra

Acredito na sorte, no mistério e no amor. Poderia não te conhecer.
Casais que se amam, amor a arte, filhos , às convicções ou dúvidas, aos amigos, o desconhecido, a atmosfera e a dor... A capacidade de amar é gigantesca e muito bom se explorada.
Diferente das novelas com as suas ausências de conflito, no amor, conflito é estruturante.
Na economia do amor, seu alcance não se procura.
Freud, ao contrário de Sartre, vê a essência precedendo a existência. Falando de amor, não se escolhe quem ama, quando foi já é. Ponto pra Freud.
Luzes lisérgicas em Copacabana, lotação no mercado de madureira, amor social e existêncial. Sensibilidade amorosa jorra da alma. Não há quem segure.
Libertar o amor, se drogar de amor, suportá-lo nas diferentes formas de expressão.
O estado de gravidez provocado pelo excesso amoroso , não dá sentido à vida, mas rasga diplomas.
Poesia abraçando o infinito, amor sem riqueza. Um circo pobre na beira da estrada. Amor é generoso e mambembe. Egoístas não acreditam no amor.

terça-feira, 8 de janeiro de 2008

Peitudas Filósofas

Peitos esporram leite contaminado. O milk ejeta como pau que goza.
Siliconadas vingaram-se de Freud.
A quem importa a perda de mobilidade? O natural é um mito! gritam pulando seus corpos sob o olhar atento de tetas retesadas.
O suporte coloidal, a adjência suplementar, vem fechar o buraco que é estar vivo. Algo falta dentro de mim? 250ml resolve!
Acreditam que agora devem dedicar seu precioso tempo destrinchando Nietzche . Assim serão completas. Peitudas filósofas. Quê mais pediria o bom moço?
Não é que Nietzche define felicidade como "o sentimento de que a potência cresce, de que uma barreira é superada." Respostas encaixadas conforme o freguês.
Decotes ousados em rostos distantes, buscam amalgamar dois seres num só.
Mutante, cyborg, andrógino ou o novo ser-humano família?
São mais olhadas no estado peituda, porém abaixa a sensibilidade epidérmica . Não esquentam. Tambem pudera, acostumaram mais com o massivo reconhecimento externo que a entrada no labirinto a dois.
Sentem mais confiança em si mesmo, a rejeição do outro deixa de jogar contra , se algo está torto, há alguma pane, não é de sua responsa. O silicone é a lei áurea da relação. Depois de anos de escravidão a chibata mudou de mão. A lei agora é no "se vira, negão."
Histéricas das classes c e d já começam parcelar o peitola à prazo. Para ódio da elite, que só lhe resta ,chorar o leite césio ou chernobyl derramado.

domingo, 6 de janeiro de 2008

Esquina das mudanças sem mudanças

Lúcio gostava sempre de uma esquina que nunca soubera o nome.
Ela ficava intacta em seus sonhos. Acordado, tinha o hábito de vigiar pequenas mudanças que a predileta sofria. Primeiro foi a mercearia, trocada por uma locadora que hoje é depósito de material plástico. Do outro lado da rua, felizmente, o bar permanecia o mesmo, apesar das mudanças de humor do dono.
Um sinal de trânsito que nunca houve, foi colocado, aumentando o barulho no reduzir e acelerar dos carros.
Cerveja gelada com óleo diesel era o que alguns frequentadores mais assíduos diziam para o Seu Messias, dono do bar.
Apesar de seu temperamento oscilante, Messias era um homem de idéias fixas. A mais conhecida era seu desejo de destruir o sinal de trânsito. Aquele sinal simbolizava para ele, o controle da mulher, reclamação dos vizinhos , e até mesmo a burocracia de "fechar o caixa". Sentia que destruindo o sinal estaria resolvendo seus problemas.
Em uma madrugada tranquila de segunda -feira, após fechar o bar, Messias serrou o mastro que sustentava o sinal causando um imenso estrondo.
Ignorando o acender de luzes da vizinhança, saiu calmamente assobiando, sem esconder a responsabilidade do ato, pois era barato perto do peso que tirava das costas.
No dia seguinte, abriu o bar, o mastro deitado na calçada e um técnico informando que apesar da barbaridade cometida, o sinal não iria ser reposto, e que em seu lugar seria substituído por lombadas eletrônicas.
Regressando à velha esquina, Lúcio vê mudanças, como a nova lombada. Irritado, chega ao Seu Messias que o tranquiliza:
-Meu filho, Essa lombada trouxe-me a paz que eu sempre quis.
Lúcio recebe um fluxo de bem- estar e começa aceitar mudanças sem resignação.
Messias, logo, logo, achará novo problema na azeitona de sua empada.